Uma pessoa criativa entende que deve existir uma maneira melhor de lidar com algo ou alguém. Mas algumas amarras nos impedem de ter um pensamento inovador
Por Jackie de Botton, colunista de VOCÊ RH
Uma pessoa criativa é alguém particularmente comprometido com a ideia de que deve haver uma maneira melhor de lidar com algo ou alguém. Quando somos criativos, adaptamos o que está à mão – combinando, reorganizando – não necessariamente começando do zero – para que o resultado corresponda melhor aos nossos interesses e ideais. Ou seja, todos temos capacidade de ser criativos, incluindo eu e você. Essa habilidade não é privilégio de um grupo seleto de pessoas.
Na The School of Life (TSOL) acreditamos que a criatividade começa com a recusa de aceitar o status quo. Também cremos que ela, raramente, nasce do nada. Normalmente, ela tem origem na combinação de ideias, imagens ou objetos que já existem e que aguardam uma oportunidade de serem combinados ou utilizados de maneiras novas e transformadoras.
Momentos desafiadores impulsionam a criatividade
Uma crise, como a que estamos vivendo, é também um fertilizante para que a inovação e a criatividade floresçam. Aliás, a etimologia da palavra crise, em latim, também significa crescimento. Tenho, inclusive, um exemplo pessoal para compartilhar e comprovar essa crença.
No ano passado, da noite para o dia, minha sócia Diana Gabanyi e eu fomos obrigadas a suspender as atividades presenciais na sede da TSOL na Vila Madalena. As aulas online eram um projeto que ainda estava no papel. Tivemos que reordenar prioridades, trabalhar com a escassez e pensar em novas formas de comunicação digital. Tomamos decisões rápidas que, talvez, demorassem anos para serem concluídas e implementadas. Estão sendo tempos desafiadores com atividades exclusivamente on-line e que estimulam a nossa criatividade diariamente.
Bloqueios da mente criativa
É possível que você esteja se perguntando: “Então, se qualquer um pode aprender a ser mais criativo, o que de fato nos bloqueia?”. A resposta é: autoconhecimento. Na TSOL, acreditamos que devemos treinar o autoconhecimento assim como é possível fazer com músculos do corpo, que alongamos antes de correr, nadar ou pedalar.
Só ele é capaz de nos ajudar a identificar o que nos paralisa e lidar com essas travas. Esse exercício constante é tão importante quanto aprender a exercer uma mente criativa. E, para dar uma pista de como a nossa mente funciona, aqui vão dois vilões da mente criativa:
1. Ansiedade da originalidade
Frequentemente, quando somos convidados a ser mais criativos, nós achamos que tudo já foi pensado, feito e dito. Não devemos pensar assim. Em parte porque o desafio da criatividade é confiar no nosso instinto. Mesmo quando temos certeza de que outras pessoas pensaram na mesma coisa, devemos pôr a mão na massa e, no mínimo, executar nosso projeto mais rápido ou melhor do que eles. A história mostra que muitas ideias geniais eram aparentemente banais antes de serem realizadas.
2. Autocrítica
A crítica em relação ao nosso próprio trabalho não deve ser motivo para desespero. Pode ser útil lembrar que a insatisfação é uma parte crucial do processo criativo e um sinal de que nós temos bom gosto e padrões elevados para o nosso trabalho. Muitos grandes artistas ficaram anos melhorando e recompondo seu trabalho antes de ele ficar perfeito.
Sobre a autocrítica, eu queria contar algo que poucas pessoas sabem. Quando eu era pequena, ainda no pré-primário, minha professora pediu para que toda a sala desenhasse uma pipa. Findo o tempo, lá fui eu entregar o papel em branco. Diante do espanto da professora, afirmei que minha pipa estava voando…Acabei por ser chamada atenção. De birra, peguei o lápis e fiz um pontinho quase transparente e afirmei que ali estava minha pipa, que de tão alta quase não podia ser vista.
Conto isso para te convidar a avaliar que, talvez, a sua criatividade esteja bloqueada pela internalização da voz de uma crítica consistente de um parente, uma professora ou alguém que tenha alguma influência sobre a sua vida. Essa conversa pode ter sido em um momento da infância, ontem ou em qualquer outra ocasião da vida.
De uma perspectiva psico-histórica, é sempre produtivo se perguntar por que pode ser tão difícil desenvolver a criatividade. Este é um caminho para o desbloqueio e também um tópico interessante, que vale a pena explorar por conta própria ou com ajuda de um especialista.
Como não teremos tempo de aprofundar essa busca nesse artigo, deixo você com uma frase do artista francês Henri Matisse, que resume o que eu penso: “Criatividade requer coragem!”.